Cansados de correr atrás dos prejuízos impostos pelo atraso em se adaptar aos tempos da música digital no passado, artistas estão tomando a frente de uma nova revolução musical e abrançando tecnologias que os colocam mais próximos de seus fãs - e, de quebra, ainda rendem uns "trocos" a mais na conta ao final do mês.
Na nova ordem da música pós-MP3 e MySpace vale tudo: transmitir shows pelo YouTube ou pelo Twitter, distribuir música "de graça" em troca de uma twittada, até usar a web para compor parcerias entre fãs e artistas.
Fora da rede, a mudança de postura também acontece: tem fã que pode levar o assento embora depois de um show do Bon Jovi, outro que participa de um videoclipe do Zezé DiCamargo e Luciano e até os sortudos que podem dividir um refri com o Restart no camarim sem ser filho, necessariamente, de diretor da gravadora. São os novos VIPs.
Fidelizar os fãs
Cerca de um ano atrás, Lucas Silveira, vocalista da banda Fresno, recebeu de um fã a dica sobre a Twitcam, aplicativo que permite a ele interagir com seus seguidores do Twitter por meio de uma webcam. “Resolvi logar e tocar algumas músicas no violão. Lotou na hora”, lembra.
Em pouco tempo, Lucas já estava fazendo muito mais do que dedilhar umas notas ao violão. No início deste mês, o grupo resolveu lançar seu novo disco, “Revanche”, mostrando as novas faixas na Twitcam.
Mas como o sistema ainda não é muito estável para grandes eventos - “às vezes acontece de sair do ar, quando tem 8 mil pessoas logadas” -, o cantor do Fresno diz que também continua a aparecer sozinho na Twittcam para tocar e bater um papo com os fãs. “Não é uma ideia da gravadora nem nada, a gente simplesmente faz porque gosta. É um instrumento para fidelizar o fã”, garante. "É uma maneira de estar mais perto de quem acompanha a sua carreira”, resume.
“Quando você responde a uma pessoa no Twitter, ela se sente muito importante”, concorda o sertanejo Luciano, da dupla Zezé Di Camargo e Luciano. Junto com Zezé, ele está montando um estúdio próprio para mostrar seus ensaios e gravações na internet.
A ideia é profissionalizar o que outros têm feito de forma amadora. “Quero fugir dessa maneira arcaica da Twitcam, quero produção por trás”, afirma Luciano, que também grava imagens de seus shows com o celular, edita com as gravações feitas por sua equipe e sobe no YouTube.
O único problema é que às vezes a sua gravadora, Sony Music, pede para o site tirar os vídeos do ar, por não estarem no canal “oficial”. “Eles não conseguem ser totalmente independentes, ficam presos.”
Fãs participativos
De olho nas novas tendências, a dupla Zezé di Camargo e Luciano criou ainda outra forma de ficar perto virtualmente do público com o clipe interativo de “Tapas na cara”, onde qualquer um pode inserir a própria fotografia no vídeo e fazer parte da história.
Já o cantor Tico Santa-Cruz, do Detonautas Roque Clube, é mais ousado ainda no contato direto com os fãs. Além dos “saraus eletrônicos” que promove pelo seu canal no site Justin.tv, ele chegou a compor uma música com seus seguidores do Twitter. "Dei um tema difiícil até - eterno retorno - e pedi versos. Depois abri meu canal no Justin.tv e mostrei no violão a melodia. Peguei quatro e cinco versos, ficou muito interessante", conta.
Rafael Ramos, produtor da gravadora Deckdisk e criador do selo Vigilante, casa de novos artistas como Vivendo do Ócio e Boss in Drama, acha que a nova geração de músicos entende melhor a relação com os fãs via internet. “Alguns preferem abrir mão de um roadie para levar um cameraman na turnê e registrar os shows para colocar no site”, revela.
Pioneiro no Brasil na utilização do sistema “Pay with a tweet”, onde o fã “paga” pelo download de uma música com um post automático em sua conta no Twitter, o selo Vigilante registrou 2 mil downloads no primeiro dia de funcionamento do sistema.
Rafael diz que o próximo passo é o “Show em casa”. “Se o The Name [grupo de pós-punk de Sorocaba] for fazer um show em Fortaleza e alguém de São Paulo quiser assistir sem sair de casa, se registra no site e vê a apresentação ao vivo pela internet”, exemplifica.
Os novos VIPs
Transmissões ao vivo pela rede não são novidades na música pop. Em 2009, o U2 mostrou o seu show “U2 360º” para o mundo pelo seu canal oficial no YouTube. Em agosto deste ano, o Arcade Fire vai estrear o projeto “Unstaged”, que vai trazer apresentações diferentes artistas, como John Legend e The Roots. Para o primeiro evento, a direção fica por conta de Terry Gilliam, responsável por “O mundo imaginário de Dr. Parnassus”.
Quem não se contentar com a distância do ídolo na tela – ou mesmo no palco – pode chegar mais perto ainda desembolsando quantias razoáveis em dinheiro. Nos EUA e na Europa, grupos já oferecem pacotes VIPs especiais para os fãs.
Uma recente reportagem da revista norte-americana “Rolling Stone” mostra o que grupos como Kiss, Bon Jovi e Aerosmith têm a oferecer para quem quiser um tratamento super-especial em seus shows.
Gastando US$ 975, os fãs do Kiss não precisam nem levar sua câmera de vídeo. Eles ganham uma, junto com outros mimos e o direito de tirar uma foto com o grupo. Por US$ 1.450, é possível participar de uma festa com karaokê e bebida liberada antes do show do Aerosmith e. por US$ 1.875, é possível levar até a cadeira onde se sentou durante um show do Bon Jovi.
A Time For Fun, empresa que produziu os shows do Kiss e do Aerosmith no Brasil e que vai trazer Bon Jovi a São Paulo em outubro, informa que esse tipo de evento chamado “meeting & greet” (“encontro & conversa”) também acontece em apresentações no país, mas que cada artista já traz a sua lista de contemplados de fora, com nomes que se cadastraram nos fã-clubes oficiais.
Entre os artistas brasileiros, a prática ainda não é comum, mas já começa a ser explorada. Nos shows das matinês de happy rock do Restart, os fãs podem comprar diferentes pacotes VIP. Um dá direito a assistir à passagem de som do grupo, com o fã podendo subir no palco nos 15 minutos finais. Outro garante uma foto com o grupo, autografada e impressa na hora. E um terceiro permite participar de um encontro de meia-hora com os músicos no camarim após o show, com direito a petiscos e refrigerantes.
Já os fãs de Zezé di Camargo e Luciano têm mais chance de encontrar os ídolos ao vivo graças ao Twitter. Em cada show que fazem, eles sorteiam quatro seguidores para conhecerem a dupla no camarim. Prometendo novas ideias, Luciano resume bem a nova relação com seus admiradores. “Na internet, o público não vem mais até nós, nós que temos que ir até ele”.
Fonte: G1
Posted in: Madame Ravel
